Nos últimos meses do ano, é essencial que as empresas façam uma avaliação da situação real do desempenho do seu negócio, de forma a preparar atempadamente alguns aspetos relacionados com o encerramento de contas.
Existe um conjunto de procedimentos necessários de forma a garantir que as Demonstrações Financeiras que irão ser preparadas revelem uma imagem verdadeira e apropriada da posição financeira da empresa no momento do relato.
Um dos aspetos importantes a ter em atenção são os valores registados na rubrica de dívidas de clientes e o reconhecimento de possíveis perdas por imparidade.
A atual situação de instabilidade, com inúmeros fatores a condicionar a atividade das empresas, aumenta o risco associado ao recebimento de clientes, uma vez que, ao conceder crédito nas suas relações comerciais, as empresas acabam por assumir riscos com a probabilidade existente de não recebimento.
As dívidas a receber de clientes são considerados ativos financeiros com maturidade definida, ou seja, com um prazo de vencimento definido e devem ser reconhecidos na contabilidade ao custo (ou custo amortizado), menos as perdas por imparidade.
Uma perda por imparidade corresponde a uma redução do valor contabilístico de um ativo, de forma a demonstrar uma perda potencial ou efetiva do seu valor.
O reconhecimento das perdas de imparidade deverá ser avaliado no final de cada período contabilístico e sempre que existam dúvidas relativamente à cobrabilidade de uma dívida a receber.
O reconhecimento de perdas imparidade deve ocorrer quando existem evidências objetivas de uma possível perda e permite assegurar que os ativos não se encontrem mensurados na contabilidade por uma quantia superior à quantia recuperável.
> As normas indicam como exemplos de evidências objetivas de possíveis perdas, entre outras, as seguintes:
– Significativa dificuldade financeira do devedor;
– Incumprimento sistemático dos prazos de pagamento acordados;
– Necessidade de renegociação da dívida,
– Quebra contratual, tal como não pagamento ou incumprimento no pagamento do juro ou amortização da divida;
– Probabilidade de o devedor entrar em falência (insolvência);
– Existência de processos judiciais em curso;
– Entre outras.
Para as situações acima identificadas é fundamental a existência de meios de prova que evidenciem a existência das tentativas de cobrança da dívida. Deverá existir um mapa de antiguidade de saldos e comprovativos das várias tentativas de cobrança (ex: e-mails de cobrança, cartas, etc). Por outro lado, é importante obter comprovativos da existência de clientes com eventuais processos judiciais em curso.
O reconhecimento de uma perda por imparidade num determinado momento não invalida que no futuro, caso as condições se alterem, esta possa vir a ser revertida.
> Em termos fiscais:
O Código do IRC, CIRC, estabelece que as perdas por imparidade em dívidas a receber de clientes apenas podem ser deduzidas ao lucro tributável nos termos previstos na alínea a) do nº 1 do artigo 28-A e do artigo 28º-B.
Ou seja, para as imparidades serem consideradas custo em IRC, os créditos devem:
– Estar relacionados com a atividade normal da empresa;
– Estar evidenciados na contabilidade como sendo de cobrança duvidosa;
– Estar contabilizados no período de tributação em que foram considerados de cobrança duvidosa e ter o risco de incobrabilidade efetivamente comprovado, o que acontece nas seguintes situações:
- a) O devedor tenha pendente processo de execução, processo de insolvência, processo especial de revitalização ou procedimento de recuperação de empresas por via extrajudicial (SIREVE);
- b) Os créditos tenham sido reclamados judicialmente ou em tribunal arbitral;
- c) Os créditos estejam em mora há mais de seis meses desde a data do respetivo vencimento e existam provas de terem sido efetuadas diligências para o seu recebimento.
> O montante anual acumulado da perda por imparidade de créditos em mora, para ser aceite fiscalmente, não pode ser superior às seguintes percentagens:
- 25% para créditos em mora há mais de 6 meses e até 12 meses;
- 50% para créditos em mora há mais de 12 meses e até 18 meses;
- 75% para créditos em mora há mais de 18 meses e até 24 meses;
- 100% para créditos em mora há mais de 24 meses.
> Não são considerados de cobrança duvidosa, os créditos que estejam nas seguintes condições:
– Créditos sobre o Estado, regiões autónomas e autarquias locais ou aqueles em que estas entidades tenham prestado aval;
– Os créditos cobertos por seguros;
– Os créditos sobre pessoas singulares ou coletivas que detenham direta ou indiretamente, nos termos do nº 6 do artigo 69º do CIRC, mais de 10% do capital da empresa;
– Os créditos sobre empresas participadas, direta ou indiretamente, nos termos do nº 6 do artigo 69º do CIRC, em mais de 10% do capital.
Os prazos mencionados devem ser usados somente para determinação do limite máximo fiscal aceite. Não se exige que a contabilidade registe as imparidades com base nestes prazos, devendo o registo contabilístico ser efetuado com base nas previsões de perda.
Reforçamos, uma vez mais, a importância de as Demonstrações Financeiras refletirem informação real e verdadeira, uma vez que são a base para determinar indicadores financeiros e económicos, essenciais para uma correta análise da evolução e desempenho das empresas.