No dia 23 de fevereiro de 2023 a TVI publicou uma reportagem sobre as rendas das casas em Lisboa: uma reportagem de extrema importância e muito bem conseguida na minha opinião tanto pelo facto de a exposição ser muito clara como pela pequena dose de humor que também alivia um tema tão sério. A reportagem concentrou-se maioritariamente no individuo, licenciado e na sua dificuldade (ou na impossibilidade) de atingir a sua independência em Lisboa derivado do custo absurdo da situação.
Aqui tentarei focar-me nas razoes e principalmente nas consequências e na aplicação das mesmas ao setor empresarial.
As causas são relativamente simples e um assunto já muito explorado… a inflação juntamente com a especulação, o investimento por parte de empresas que pretendem alugar as casas em formato “airBnB” a turistas que pretendem visitar a linda capital levam a um aumento dos preços das habitações por meio de um aumento de procura e por sua vez a um aumento das rendas porque mensalmente as casas passam a ter de dar um retorno idêntico ao do turismo mesmo que os moradores sejam recém-licenciados.
O grande problema com isto é que, como também já foi mencionado muitas vezes, o salário nacional não corresponde ao do estrangeiro muito embora os custos de vida se aproximem cada vez mais.
Então em que ficamos? Num desocupar forçado da capital. Os jovens, possuidores de talento, mas ainda instáveis em termos financeiros, não conseguem “levantar-se” perante o peso destas limitações e são subtilmente (ou não) expulsos da cidade. São então obrigados a migrar. Isto vai criar o quê?
Em primeiro lugar há uma perda de competitividade empresarial em Lisboa (e nas grandes cidades) mas fiquemos por Lisboa como exemplo principal) porque o talento fica mais caro também. Quem é verdadeiramente competente e quer ficar pode exigir um salário mais alto, e neste caso tem apenas a ver com querer viver numa casa maior do que “17 metros quadrados” como fala a reportagem acima mencionada. E as empresas que não conseguirem cumprir com esta expectativa serão obrigadas a escolher os seus candidatos de um grupo mais mediano em termos de capacidades e ver “os melhores a serem recolhidos pelos maiores” como grupos internacionais etc.
Em segundo lugar isto, penso eu, vai provocar uma descentralização dos trabalhadores que deixarão de ver Lisboa como o objetivo já que um salário de 2500€ líquidos valerá menos em Lisboa do que um salário de 1200€ vale em mais de metade do país. O único problema é que essa metade do país não tem grande oferta de trabalho. O Algarve por exemplo tem muito pouca densidade empresarial nos setores bancários e judicial comparativamente a Lisboa. Haverá escritórios em Lisboa com mais jovens advogados ou analistas do que em cidades inteiras no Algarve. Esta situação vai pressionar a um aumento da oferta de trabalho noutras regiões do país, mas vai também providenciar recursos para tal já que o talento vai começar a sair das “Lisboas” de Portugal. Será caso para o empresário ponderar muito seriamente a recolocação ou a localização geográfica para criar a sua empresa e talvez poupar em termos de local e oferecer mais aos candidatos para que se desloquem e tenham boas condições para começar uma vida noutro lugar.
Em último caso e como medida não ótima, mas muito eficiente vem o teletrabalho. Digo não ótima porque para providenciar teletrabalho uma empresa já tem de ter uma estrutura muito bem montada ou criar uma de raiz. Quando está tudo perfeitamente na linha um colaborador pode viver onde quiser e trabalhar noutro local até mesmo noutro continente para a empresa que tem a sede onde quiser também. Mas isto não é possível para todos os setores ou todas as empresas e aí mais uma vez veremos as pequenas e médias empresas que não estiverem devidamente preparadas a perder competitividade tornando-se fulcral um acompanhamento de gestão que permita avaliar, ponderar e combater estes desafios.
E sim, isto tudo porque as rendas nas metrópoles estão a subir como nunca antes visto e a inflação e custos não param de aumentar também. E na era da informação e do distanciamento da cultura de “vestir a camisola”, é importante que as empresas tenham presente que o trabalho se torna cada vez mais um negócio também e que têm de passar a analisar mais e ter melhor em conta as necessidades e vontades do vendedor ou, neste caso, do colaborador.